“O cooperativismo está para a sociedade civil, nesse período do século XX, como uma resposta organizada para quando o Estado falha. A habitação era um problema nacional e houve um grande boom de cooperativas de construção nas décadas de 1970 e 1980. Elas encontraram espaço nessa função social que estava prevista no texto fundamental”, ressaltou Mendes Pinto. Com a abertura para o desenvolvimento desse tipo de negócio em um Estado centralizador, as cooperativas se expandiram para outros setores, como o cultural, o financeiro e o agrícola. “Hoje, algumas delas se transformaram em empresas de extremo sucesso, exportando diversos produtos nacionais. Os vinhos portugueses, por exemplo, têm a sua exportação na mão das cooperativas”, explicou o professor.
Na abertura do evento, o presidente nacional do IAB, Sydney Limeira Sanches, destacou que o compartilhamento de conhecimentos entre juristas portugueses e brasileiros é parte importante do trabalho da entidade: “Desde a fundação do Instituto, temos um elo com Portugal, já que o Direito português teve grande importância para a constituição do nosso Direito. Essa conexão é permanente porque sempre haverá espaço para a troca de experiências e informações”.
O webinar também teve palestras do presidente da Comissão de Direito Cooperativo do IAB, Paulo Renato Fernandes da Silva, e do professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) Marco Aurélio Peri Guedes. A mediação foi feita pela consócia Adriana Amaral, que também integra a Comissão de Direito Cooperativo do IAB.
Histórico português – Autor do livro Portugal - delineamentos de uma história constitucional (1812-1976), Marco Aurélio Guedes afirmou que o desenvolvimento empresarial lusitano está atrelado a uma grande influência estatal. “Por convergência de interesses políticos, militares e religiosos, o modelo econômico português é marcado pela centralização do Estado. Essa postura nos permite identificar um espaço muito limitado para o desenvolvimento da atividade empresarial”, explicou o professor.
Guedes apontou que após a Revolução dos Cravos, em 1974, o país passou por um avanço progressista. Ele ressaltou que com a nova constituição, Portugal se voltou para uma organização socialista onde há, ideologicamente, um ambiente mais restritivo ao desenvolvimento empresarial. “Desde então, tem acontecido um avanço lento na abertura da economia portuguesa a uma cultura empresarial que, em outros países europeus, já está assentada há muito tempo”, disse ele. Segundo o professor, esse cenário tem reflexos na existência das cooperativas: “Os estudos sobre o tema precisam analisar se efetivamente o trabalho das cooperativas não seria melhor sem tanta presença do Estado na economia”.
Contexto brasileiro – Em sua palestra, Paulo Renato Silva apontou que o sistema constitucional no Brasil, a partir de 1988, se afastou do regime econômico adotado por Portugal. Isso porque a Carta Magna estabeleceu que o desenvolvimento da liberdade econômica nacional fica a cargo da iniciativa privada. “Somente de forma subsidiária, em duas situações previstas na Constituição, é que o Estado pode exercer atividade econômica, que são os casos de segurança nacional e relevante interesse coletivo”, disse ele.
O advogado também destacou que no Brasil o Direito Cooperativo foi usado no texto constitucional como meio para resolução de problemas. “Um exemplo disso é o caso do garimpo. No País, conhecemos diversas situações de garimpos ilegais sem qualquer condição digna de trabalho. A Constituição de 1988 estimulou o cooperativismo nesse segmento para ir contra os problemas criminais, sociais e ambientais decorrentes dessa prática”, explicou Paulo Renato Silva.