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Quarta, 11 Dezembro 2024 13:10

Em evento do IAB, criminalista aponta influência de Jeremy Bentham no sistema prisional brasileiro

 Bruna Martins Bruna Martins

A consolidação da prisão no Brasil, segundo a integrante da Comissão de Criminologia do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) Bruna Martins, sofreu influência direta das ideias do filósofo inglês Jeremy Bentham. Ela apontou que na obra Teoria das penas e das recompensas (1825), o autor sistematiza aquela que seria eleita a principal forma de punir no Brasil imperial: a pena de prisão por trabalho. Durante o evento Jeremy Bentham: vigilância, correção e punição, promovido pelo IAB nesta terça-feira (10/12), a advogada explicou o motivo de o autor, considerado o pai do utilitarismo, defender esse modelo: “Para ele, o que justifica o castigo é a sua maior utilidade, ou a sua necessidade. Todo delinquente é tratado como inimigo público”.

As penas de prisão por trabalho se davam, durante o Império, na Casa de Correção da Corte, inaugurada em 1850. Segundo a professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) Icléia Thiesen, a Casa de Correção abrigou pela primeira vez práticas penais que foram consolidadas no sistema brasileiro: “Essa prisão, inspirada no modelo desenhado por Bentham, foi palco de inúmeras práticas identificatórias que se instituíram ao longo do tempo. É o caso da fotografia e das pesquisas associadas ao saber médico-jurídico”. 

Trazendo essa estrutura para os dias atuais, o doutor em História André Zully disse que a realidade policial mostra que a construção do Estado brasileiro também passou por processos de elaboração de uma base de informações e de análise: “Inegavelmente, Bentham está inserido dentro desse processo de construção, centralização e racionalização do Estado”.

Da esq. para a dir., Joice Soares, Bruna Martins, Icléia Thiesen, Aloysio Martins, Marcia Dinis, Gizlene Neder, Gisálio Cerqueira e André Zully

A presidente da Comissão de Criminologia do IAB, Marcia Dinis, deu destaque à importância de Bentham para o Direito, tendo ele influenciado na codificação das leis e nas narrativas de vigilância do sistema penal: “Michel Foucault, no livro Vigiar e Punir, mostra que o panóptico, idealizado por Bentham, teve o objetivo de criar um modelo racional que maximizaria a base disciplinar dos presos, minimizando os custos com vigilante. Esse é apenas um dos exemplos da importância de sua obra para o mundo jurídico”, disse Dinis na abertura do webinar.

O evento também contou com palestras dos professores da Universidade Federal Fluminense (UFF) Gisálio Cerqueira e Gizlene Neder, do membro da Comissão de Direitos Humanos do IAB Aloysio Martins e da professora da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence) Joice Soares. 

Segundo Joice Soares, a influência de Bentham pode ser percebida na transformação institucional da polícia brasileira, ainda no período imperial. “Ele contribuiu para a elaboração do Código Criminal de 1830, mas também é possível verificar sua influência no Código de Processo Criminal de 1832, na medida em que vão ser discutidas as instâncias que deveriam integrar essa nova estrutura policial. Então, pensando em um modelo policial liberal, independente e monárquico, se pretende que os indivíduos que integram essas instituições sejam, a princípio, cidadãos”, contou a professora.

Aloysio Martins traçou um perfil do autor, sublinhando que o filósofo era membro da alta aristocracia conservadora e produziu muito: ele morreu deixando cerca de 60 mil páginas manuscritas de trabalho. “Para compreender toda essa obra, é preciso perceber que se trata de um tipo de produção intelectual orgânica, fruto de um extrato liberal que vai se construindo em oposição aos ditos conservadores e mostrando que a filosofia, o pensamento e a colocação das ideias são transformadores”, afirmou.

A importância dessa leitura para a política brasileira foi ressaltada por Gizlene Neder, que pesquisou a Assembleia Constituinte de 1823. A professora apontou que Bentham era um dos autores mais citados pelos parlamentares da época. “No parlamento brasileiro, Bentham é lido e referido, mas suas traduções não chegaram logo”, ponderou Neder. De acordo com ela, para compreender esse processo de importação de ideias, é preciso olhar para a influência dos maçons brasileiros: “Aqueles que atuaram nas cortes portuguesas e estiveram presentes no processo de independência mandaram traduzir o livro do Bentham que trata sobre legislações”.

Já Gisálio Cerqueira defendeu que as reflexões feitas a partir de importantes pensadores, como Bentham, devem encontrar amparo na experiência singular dos pesquisadores. 
 

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