MURAL DA PRESIDÊNCIA

Quem acusa e julga?

Há no Brasil um inequívoco movimento terrorista penal, insuflado por órgãos de imprensa que atiram ao público consumidor - notadamente pela televisão - matérias diárias, contendo noticiário de crimes. Está claro que esta espécie de noticiário que, antigamente, era privativa de jornais de segunda linha, possui um excelente acatamento da audiência e, com ele, retornos financeiros. Naturalmente, o resultado é a exploração da criminalidade, a propaganda do crime e da impunidade, atingindo o esperado "clamor popular" por condenações exemplares, reclamadas por todos os jornalistas que desconhecem ou desprezam o devido processo legal.

O julgamento do Mensalão, caso de corrupção envolvendo importantes personagens do governo Lula e seus aliados, tornou-se tão popular como a novela do momento, graças à TV Justiça. Jornalistas da imprensa escrita, do rádio e da televisão, opinaram e opinam sobre cada episódio do julgamento, que dura mais de 2 meses, inclusive sobre o tamanho das penas e questões técnicas que envolvem o complexo processo de sua aplicação. Opinaram como se opina sobre futebol e concurso de escola de samba. Todos passaram a conhecer o direito penal, e todos têm a exata medida da boa realização de justiça. Criticam magistrados experimentados, como criticariam um técnico de futebol que perdeu o último jogo.

Recentemente, por outro lado, uma preocupante decisão do STJ conferiu ao Ministério Público o poder de realizar diretamente em suas instalações interceptações telefônicas, para fins penais, em cumprimento a ordens judiciais. Órgão de acusação por excelência, o MP continua a atuar como se fora autoridade investigadora, escolhendo, a seu critério, os temas que deseja apurar (não se limitando a investigações de crimes atribuídos à Policia). 

O MP apura sem lei que o autorize, apoiado em decisões esparsas da Suprema Corte, e, pior, sem regras a cumprir, como, por exemplo, respeitar e fazer valer a prerrogativa do advogado do investigado ao amplo acesso à investigação. A sensação de policia secreta em sede do MP é inevitável. Quem e o que andam investigando e, agora, interceptando conversas telefônicas, é coisa que ninguém sabe!

Por outro lado, há juízes que persistem em atuar em investigações, acompanhando e direcionando as atividades que determinam nas medidas cautelares de produção de prova. Assim como há juízes que ainda não se deram conta de que o processo penal adotou a modalidade acusatória, representando que o juiz não produz prova, não ordena diretamente a realização de provas, sem postulação das partes, e não faz mais indagações às testemunhas, exceto se, ao final, houver alguma dúvida residual, finda a inquirição pelas partes.

Há policiais, por seu turno, que se arvoram magistrados, apresentando os indícios que obtêm de algum fato delituoso, como se prolatassem uma sentença condenatória, emitindo juízo de valor e exibindo o investigado como autor de delito. A presunção de inocência de nada serve para certos policiais que se jactam de suas "vitórias". Estamos longe de práticas, como na Alemanha, em que a figura do indiciado é preservada: sua imagem não pode ser divulgada, como se fora um animal perseguido e preso.

Momentos muito difíceis em que, num país democrático, com regras constitucionais em vigor, verificamos deploráveis práticas procedimentais. 

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