Morando nos Estados Unidos há três anos, Gilberto Costa destacou que tem observado a evolução da indústria financeira brasileira, cujas mudanças estão promovendo cada vez mais segurança aos investidores. “Nos EUA, você não tem conta individual de cotistas, as organizações operam em contas coletivas. No Brasil, as contas de custódia são todas individuais. Então, todo esse cenário veio evoluindo com o objetivo de proteger o investidor e de segregar os ativos dele dos ativos da organização financeira”, ele exemplificou.
Na abertura do evento, a presidente da Comissão de Direito Empresarial do IAB, Érica Guerra, afirmou ser uma honra para a Casa de Montezuma promover encontros que tragam para o centro do debate jurídico temas de relevância para o mercado. Organizadora do webinar, ela destacou: “Neste evento, buscamos discutir os aspectos operacionais e jurídicos da Resolução 175/22 de forma didática e unida ao conhecimento prático”.
O webinar também contou com palestras da gerente de operações no Banco Safra, Andrea Loiola de Oliveira, do CEO e fundador do Financier Academy, Gilvan Bueno, do professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) João Manoel de Lima Junior, da membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB Evelyn Moraes Roges e da advogada e doutoranda em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Jeniffer Gomes. O chefe do Departamento de Direito Empresarial da Faculdade de Direito da Uerj, Leonardo Sant’Anna, foi o mediador do evento.
Transparência – Andrea Loiola explicou que as novas regulamentações estão criando uma outra estrutura para as instituições financeiras, o que requer uma preparação operacional robusta: “Isso traz uma divisão de classe e subclasse e toda uma questão de responsabilidade do gestor, igualando-o ao administrador na contratação dos seus prestadores de serviços”. Segundo a gerente de operações do Banco Safra, o objetivo da resolução é garantir maior transparência ao cotista. “A indústria quer trazer de fato essa transparência ao ponto de o cotista, ao chegar em uma agência, conseguir contratar o plano e ter clareza daquilo que ele está adquirindo”, comentou.
Reafirmando a importância do aumento da transparência no mercado, Gilvan Bueno lembrou que a falta de educação financeira no País tem como resultado o endividamento de 77% da população brasileira. Apesar desse cenário, ele ressaltou que a indústria de fundos de investimento representa 7 trilhões de reais, onde também há espaço para o pequeno investidor. "Hoje nós temos mais de 40 bilhões investidos no Tesouro Direto", exemplificou. Para Bueno, a Resolução 175/22 traz bons avanços para esse perfil de investidor, como a separação entre carteiras líquidas e ilíquidas. "Ela também obrigou a informação da taxa de administração exata", afirmou.
Estrutura regulatória – De acordo com João Manoel de Lima, a nova resolução se estrutura em regras gerais e anexos específicos para diferentes tipos de fundos, o que torna o regulamento mais complexo. “Antes, o regulamento funcionava como uma espécie de ‘Constituição do Fundo’, uma norma única, mas agora o modelo foi desdobrado em até três documentos diferentes”, afirmou. O professor da UFRB também apontou uma lacuna na proteção jurídica dos investidores: “Para a nossa surpresa, a resolução não tem a obrigatoriedade de previsão no regulamento dos fatores de risco”.
Por outro lado, Evelyn Moraes Roges enfatizou que, na esfera tributária, as novas regras trazem maior uniformidade e clareza. Mencionando mudanças para fundos imobiliários e fiados, ela sublinhou que a isenção de imposto de renda sobre lucros distribuídos agora requer um número mínimo de cotistas, aumentado de 50 para cem. “Além disso, caso o fundo tenha cotistas ligados a familiares com 30% ou mais de participação, ou ainda um cotista que detenha de forma individual 10% ou mais, a isenção para pessoa física não será considerada. São inovações relevantes para os fundos de investimento fechados”, disse a advogada.
Arbitragem – Em sua palestra, Jennifer Gomes abordou o tema das cláusulas arbitrais nos regulamentos dos fundos de investimento, apresentando casos reais. Ela citou um julgamento do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), onde a questão era a exigibilidade da remuneração da gestora. “Neste caso, a gestora alegou que o fundo de investimento não teria cumprido regularmente as suas obrigações estabelecidas no âmbito daquele regulamento e que havia uma cláusula compromissória para resolver litígios”, explicou. Segundo a advogada, o tribunal decidiu que o conflito deveria ser dirigido pela Corte Arbitral conforme estabelecido pelo regulamento do fundo.
Outro caso citado por Gomes aconteceu no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), onde foi questionada a eficácia da cláusula arbitral no regulamento de um fundo de investimento. “O tribunal afastou a qualidade de consumidor do investidor, concluindo que a cláusula arbitral seria eficaz e válida", apontou. De acordo com a palestrante, a decisão foi fundamentada no fato de que o cotista era um investidor qualificado e que o regulamento previa o estabelecimento daquela cláusula arbitral.