“É interessante como uma memória tão recente e tão traumática, como bombas colocadas em uma instituição como a OAB ou em um show popular com mais de 30 mil pessoas, como no Riocentro, são facilmente esquecidas em favor de uma versão pacífica de transição. Há um esquecimento desse processo”, declarou Teixeira. O professor citou que o livro Explosões conservadoras, escrito por José Airton de Farias, detalha esses crimes. “Esse livro é muito importante, mas ele também é um índice de como a Ciência Política e a História demoraram muito tempo para produzir uma obra sobre o fenômeno da violência na transição política brasileira”, completou o palestrante.
A abertura do evento foi realizada pelo secretário-geral do IAB, Jorge Rubem Folena, que sublinhou ser essencial lembrar da repressão do período da ditadura civil-militar e tratar de seus reflexos nos dias atuais. “A memória é um princípio fundamental na Constituição brasileira de 1988 e ela tem que ser reavivada para que nunca mais tenhamos no País outro golpe como o que tivemos entre 1964 e 1985”, afirmou o advogado.
O webinar também teve palestras dos deputados federais constituintes Vivaldo Barbosa e Aldo Arantes e dos professores da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jaqueline de Oliveira Muniz e Manuel Domingos Neto. Os debates foram mediados pelo presidente da Comissão de Direito Constitucional do IAB, o também deputado federal constituinte Miro Teixeira, pelo membro do IAB e doutor em Ciência Política pela UFF Sérgio Sant’Anna e por Jorge Rubem Folena.
Durante o colóquio, Miro Teixeira destacou que a realização do evento foi pensada por Sérgio Sant’Anna, que o precedeu na condução da Comissão de Direito Constitucional. Ele agradeceu ao consócio e também elogiou Francisco Carlos Teixeira: “Creio que para o Instituto dos Advogados foi muito expressivo realizar este evento e começá-lo com a palestra do brilhante professor Teixeira”. Em sua fala, Sant’Anna ressaltou que o encontro teve como tema um ponto chave de reflexão para a democracia. “Temos que resgatar a necessidade, principalmente depois do 8 de janeiro, de conhecimento da História e de enfrentamento de questões do passado que não podem ser varridas para debaixo do tapete”, disse o advogado.
Da esq. para a dir., Vivaldo Barbosa e Jorge Rubem Folena
Ao tratar do ponto de vista legal do período de redemocratização, Vivaldo Barbosa defendeu que a Constituição de 1988, apesar de suas insuficiências, reflete avanços em termos de democracia, civilidade, direitos humanos e aprimoramento do Direito, conquistados ao final da ditadura. “Ela foi construída dentro de um ambiente democrático com participação intensa da sociedade brasileira e com concepções extraordinárias. Naquele momento, o Brasil produziu, através de todas as áreas ativistas e de toda ordem social, a intelectualidade e a academia. O que de melhor o Brasil pôde elaborar naquele tempo está refletido na Constituição de 1988”, elogiou o ex-deputado, que participou da Assembleia Constituinte.
Aldo Arantes
Aldo Arantes sublinhou que o rompimento democrático teve relação direta com o crescimento do progressismo. Segundo o político, na história brasileira, sempre que há um governo de esquerda há também golpes ou tentativas. Do ponto de vista da legislação, afirmou Arantes, toda a tirania desse período foi concentrada no Ato Institucional n° 5, que radicalizou o regime ditatorial: “O AI-5 dá ao governo o poder de legislar e estabelece a censura prévia de música, cinema, teatro e televisão; a ilegalidade de reuniões políticas; a suspensão do habeas corpus (fazendo com que os presos e torturados não tivessem direito a uma medida legal para defendê-los); a destituição de funcionários públicos, incluindo juízes; a suspensão de direitos políticos de cidadãos, e a legitimidade instantânea de todos os atos praticados pela ditadura”.
Manuel Domingos Neto
Destacando a importância das Forças Armadas para uma nação, Manuel Domingos Neto pontuou que as instâncias militares devem garantir a defesa nacional e obedecer ao poder político, sem, no entanto, se imiscuir na política e quebrar o sistema democrático. O professor afirmou que uma das diretrizes da defesa nacional é a unidade dos brasileiros. “Sem coesão social qualquer país se fragiliza, se expõe e não se defende. No caso do Brasil, um ponto central da unidade é a redução das iniquidades. É inimaginável termos uma coesão social sem tratarmos dessas desigualdades, são necessárias reformas sociais”, declarou Domingos.
Jaqueline de Oliveira Muniz e Sérgio Sant’Anna
Na visão de Jaqueline de Oliveira Muniz, atualmente as Forças Armadas não têm capacidade logística para dar outro golpe. “Uma das coisas que podem ser feitas para se exercer poder legal e legítimo sem ser sabotado é blindar as Forças do uso político-partidário, de um lado, e da apropriação particularista/corporativista, de outro. Essa é a primeira lição para que se tenha previsibilidade e regularidade do poder legitimamente eleito porque, do contrário, assistimos a emancipações predatórias no Brasil que se expressam em coisas muito básicas que acontecem aqui”, opinou.