O evento foi mais uma edição do projeto Saindo do Prelo, idealizado pela diretora de Biblioteca do IAB, Marcia Dinis. O 1º vice-presidente do IAB, Carlos Eduardo Machado, abriu o webinar parabenizando Marcia Dinis pelo projeto e citou o desembargador Ney Belo e a desembargadora federal Simone Schreiber, também presente na mesa, como “juízes garantistas, sempre com posições firmes em prol das garantias individuais”. Ele desejou que ambos cheguem aos tribunais superiores, “irradiando para todo o Brasil a visão que eles têm do Direito Criminal”.
Além de Simone Schreiber, que é membro das Comissões de Direito Penal e de Criminologia do IAB, também participaram do encontro o presidente da Comissão de Direito Penal do IAB, Marcio Barandier, e o juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) Raphael Barilli, doutorando em Direito Processual pela Uerj.
Marcia Dinis explicou que essas “outras inquietações” do título do livro são artigos publicados no site Consultor Jurídico e alguns ainda inéditos. A obra divide-se em quatro eixos: o primeiro aborda temas como religiões, modernidade, tolerância; no segundo, o autor trata de sua terra natal, o Maranhão, para falar de questões universais; no terceiro, ele reflete sobre a tensão entre Direito e democracia, a partir da atuação do Poder Judiciário no Brasil, e no quarto eixo ele fala da contaminação do sistema jurídico brasileiro por ideais punitivistas. “Este livro, escrito por um desembargador, para nós, operadores do Direito, é um bálsamo. É um bálsamos ver que há juízes em Berlim e que há juízes inquietos e com as mesmas preocupações que são nossas”, afirmou Dinis.
Ney Bello
Ao fazer a apresentação da sua obra, Ney Bello disse: “A gênese deste livro é uma inquietação. As inquietações e o futuro julgamento da história foram o grande mote da construção deste livro. É uma sequência de compreensões acerca do momento que nós vivemos”. Segundo ele, não estar em Berlim significa metaforicamente não estar disponível para qualquer processo de afirmação dos direitos fundamentais. “Significa um Judiciário não afeto à construção de uma lógica de igualdade, de liberdade e, principalmente, de compreensão democrática do mundo. Ou seja, a ausência de comprometimento do Judiciário com aquilo que existe de essencial para uma sociedade moderna e democrática”, afirmou.
Em seguida, ele passou a citar seis pontos fundamentais para a compreensão do título do livro. O primeiro eixo fundamental é que o Direito Penal tem uma razão de ser e essa razão de ser não é como melhor se condenam as pessoas. “O papel do Direito Penal e do Direito Processual Penal é garantir que esse processo específico seja feito a partir de regras muito claras”, explicou. O segundo ponto no qual a obra se fundamenta é a ideia de que o Poder Judiciário não tem obrigação de seguir o senso comum das pessoas. “Essa equiparação do juiz à aceitação popular é uma distorção da compreensão do que é ser juiz”, opinou Bello.
O terceiro ponto é a ideia de que todos os magistrados se submetem a uma lógica ideológica. Para o autor do livro, “o juiz não é neutro, não pode ser neutro, não tem condição de ser neutro” e não é possível confundir imparcialidade com neutralidade. O quarto pressuposto é que essa característica de não neutralidade do magistrado deve ter um objetivo específico, que é o apego ao Estado Democrático de Direito.
O quinto item trata do grau de culturalismo que se pode inserir na compreensão do que é o Judiciário brasileiro. “Como podemos trabalhar com a realidade do nosso sistema penitenciário e princípios que, em tese, são princípios universais?”, indagou Bello. E o sexto ponto, que ele julga o mais importante deles, é a crise de racionalidade, “é tentar mostrar que se todos estão errando aquilo vira um acerto”.
Raphael Barilli
Marcio Barandier elogiou o autor, a que chamou de “um humanista” e “um pensador da realidade social”. Sobre a obra em discussão, ele leu trechos referentes à realidade do Maranhão, de onde também veio parte da sua família. Jovem juiz em Barra Mansa (RJ), Raphael Barilli afirmou que comunga de muitas das inquietações do autor do livro. Fez críticas aos concursos e à formação dos juízes, dos quais são exigidas principalmente metas de desempenho. Ao final de sua fala, Barilli se comprometeu a “ser cada vez mais um juiz comprometido com as garantias, um juiz de Berlim”.
Simone Schreiber lembrou que ela, Ney Bello e o ministro Flavio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), entraram na magistratura pouco depois da promulgação da Constituição de 1988, com a esperança de por em prática aquilo que foi expresso no texto constitucional. “Nos identificamos muito na nossa maneira de ver o mundo, e posso perceber que essas inquietações não esmoreceram. O Ney mantém o compromisso de buscar o único Judiciário possível para a construção do Estado Democrático, pautado na defesa dos direitos humanos”, afirmou ela.